As Garantías Processuais Penais No Estado Constitucional de Direito
Descargue el artículo completo en PDF. | |
23b_as_garantias_processuais_penais.pdf152kB |
Análisis elaborado desde una perspectiva que entrelaza una teoría penal crítica, contentiva de violencia punitiva así como de los fundamentos de derecho procesal penal constitucional, a partir de mecanismos tendientes a reducir las consecuencias sociales de la pena, frente al incremento de los impulsos inquisitoriales y situaciones excepcionales de poder estatal.
Sumário: 1 Intróito: firmando o local de fala. 2 O Poder de Punir (Menos). 3 “Time is Money”: o processo penal e a lógica da eficiência. 4 Fundamentos da Instrumentalidade Constitucional: garantias e formas processuais. 5 Palavras finais ou sobre o crivo ético da Alteridade. 6 Referências Bibliográficas.
Resumo: O discurso constróise numa perspectiva de entrelaçar uma teoria penal crítica, contenção da violência punitiva e fundamentos do processo penal constitucional, a partir de mecanismos de atuação tópica, desde as garantias processuais penais, tendentes a reduzir a dor, frente aos agravamentos das pulsões inquisitoriais e dos quadros excepcionais de poderio estatal.
Palavras-Chaves: Estado, Constituição, Garantias processuais penais e Alteridade.
Abstract: The speech is constructed in a perspective able to interlace a critical criminal theory, containment of the punitive violence and beddings of the constitucional criminal process, from mechanisms of topic performance, since the criminal procedural guarantees, tended to reduce the pain in front of the aggravation of the inquisitorial impulses and the excepcionable pictures of the state power.
1. Intróito: firmando o local de fala
As opções e as referências devem ser postas claramente. O saber jurídico deve dizerse a que serve. Ainda que se saiba das falácias de um sistema que se pretende harmônico e coerente, no quadro de uma Constituição republicana, cabe velar por mecanismos que proponham o poder de controlar, limitar, reduzir a força das agências jurídicas de criminalização. Longe estamos de retornar à “ilusão da segurança jurídica” inerentes a um Estado Policial, entretanto tratase de defender uma resposta minimamente segura no quadro de um Estado Constitucional de Direito. Não se pretende ser politicamente neutro, mas definir de antemão desde um método construtivo e limitador aos impulsos arbitrários do poder de punir. Suma, o que se tenta analisar aqui é a necessidade de não nos submeter à servidão de um Estado legal dogmático.
2. O Poder de Punir (Menos)
A deslegitimação do sistema penal é um dado da situação operativa inafastável e leva à consideração de que o poder punitivo é sempre exercido de modo irracional. Assim devese trabalhar com as diretrizes de um direito penal constitucionalmente ético e garantidor assumindo plenamente esta realidade de poder. O Direito Penal, e desde sua realidade dinâmica – o processo penal, deve sim conviver, tragicamente, com os transbordamentos do Estado de Polícia (exceção) contido em cada Estado de Direito. Nas palavras de Zaffaroni, Batista, Slokar e Alagia, devese programar o exercício do poder jurídico como um ‘dique’, levandose em conta que os níveis das águas das arbitrariedades sempre os ultrapassam. Procurase filtrar estas pulsões irracionais reduzindo os danos causados com uma “contrapulsão jurídica” ao poder punitivo do Estado policial, ou seja, como um claro limite, presente nas sucessivas situações processuais. A postura do operador jurídico, não apenas do magistrado, deve estar ciente de seu caráter trágico, sempre resistindo ao poder punitivo.
Se o poder punitivo é uma força irracional e o direito penal deve dar passagem somente àquela parte dela que menos comprometa a racionalidade do Estado de Direito, a seleção penal deve ser racional, para compensar – até onde puder – a violência seletiva irracional da torrente punitiva. É a pluralidade de atitudes, nos mais diversos momentos potencializados no acertamento caso penal, segundo a idéia de salvaguardar a jovem experiência do Estado Constitucional de Direito.
Assim, o discurso que se põe vai no sentido de construir um feixe de elementos, ancorados na constituição, que permita às agências jurídicas um exercício de contenção ao ilimitado, arrasador e estrutural poder punitivo estatal, com o cuidado de que o próprio discurso não ofereça argumentos puramente políticos, assistemáticos e conjunturais. Assim, devem se articular o máximo de dados de realidade que se possa angariar, longe dos “metafisicados homogenizantes” –se quiserem, chamemos de esfera do “ser”– com um discurso progressivamente redutor das violências punitivas com base nos princípios constitucionais e internacionais limitadores – âmbito programático do “devir”.
Entre destroços humanos e institucionais que ficam pelo caminho do sistema penal, entendese que com o ideário de reduzir danos se estará minimizando o sofrimento produzido pelas mais diversas fontes de arbitrariedade do poder institucional, e se valoriza o que há de vital e construtivo sob a aparência de desumanidade.
Não se busca, de forma alguma, dar novo fôlego a nenhuma teoria da pena – empreender novo esforço na doentia tentativa de legitimála –, mas encarála de maneira agnóstica. Por certo, devese retomar o debate do liberalismo penal interrompido pela “polícia positivista” – evidentemente não como uma (re)visita ao museu – contudo para extirpar o germe antiliberal do discurso. Há mais de um século já colocava Tobias Barreto o caráter eminentemente político de qualquer conceito de pena, e em suas clássicas palavras: quem procura o fundamento jurídico da pena deve também procurar, se é que não encontrou, o fundamento jurídico da guerra.
Negase assim o viés declarado e não cumprido das inúmeras teorias de justificação da pena – vizio ideológico e metaetico, pois é a pena uma manifestação fática afastada de qualquer fundamentação jurídica racional, fator que se agrava e contribui para a total deslegitimação do sistema penal, ainda mais quando tratamos da realidade latino-americana.
Trazse novamente o papel do direito como limite da política, na medida em que o discurso penalístico se afasta da (re)condução∕ (re)legitimação de alguma teoria da pena, e como numa guerra, a programação deve obedecer uma estratégia de salvar vidas humanas, similar à tarefa da “Cruz Vermelha” – que evidentemente não tem poder para acabar com os conflitos bélicos. Não mais uma teoria justificante do direito de punir, mas um apanhado teórico-normativo capaz de impor certos limites, com fins específicos de evitar mais sofrimento. Este deve ser o objetivo imediato das agências judiciais de acordo com um discurso que estabelece limites máximos de irracionalidade tolerável. Em certa medida esta será a tarefa do discurso jurídico-penal, mais especificamente quanto ao modelo processual penal de garantias.
3. “Time is Money”: o processo penal e a lógica da eficiência
O discurso da ambição científico-penal que se trava aqui, capitaneada pelo fenômeno da velocidade, no campo processual, refletese no exercício de aceleração procedimental, tendo como pano de fundo ou pedra de toque a idéia da “eficácia pela eficácia”, que nada mais é do que a tradução neoliberal do “time is money”. A ninguém dentre os operadores jurídicos, como assevera Coutinho, é dada a benesse de desconhecer esta temática em virtude da relevância que carrega em si, sob pena de levar à alienação que, não raro, alija.
Este movimento de matriz economicista que se vê hoje transformado em discurso oficial – fundamentalmente pela mídia – tem no chamado neoliberalismo a teoria que o sustenta. Da mesma maneira que nossas sociedades do risco desmesurado apenas elevam o capitalismo a um novo patamar, como referido, a ‘sociedad de carreras’ também não o exclui, ou seja, utilizase desta dinâmica. La cara oculta de la riqueza y de la acumulación, es decir, la capitalización, es la aceleración.
Foi em 1947 na chamada Sociedade de Mont Pèlerin inspirada por Hayek – capitão da escola austríaca de economia – que foram preparadas as bases para um capitalismo duro e sem regras. Seguise pela chamada “Public Choice” sob o comando de Buchanan e primordialmente mais tarde pelos teóricos da Escola de Chicago liderados por Friedman a substituição epistemológica do ideário causa-efeito pelo de ação eficiente.
Como descreve Coutinho, a premissa de que não podemos ter o domínio cognoscível integral dos resultados de nossas ações (não as podemos prever), razão por que haveríamos de encampar um racionalismo eficientista é ignorar a humildade com a qual nos apresentamos diante do desconhecido. Sendo impossível a correta previsão dos resultados, os centros de interesse voltamse aos “meios”.
De fato, ao revés de ser um ato de grandeza (sei que não sei tudo!), é simplesmente um ato de aparente esperteza, mas, no fundo, ao que parece, psicótico porque paranóico, desde que o naturalismo do mercado é tomado, ainda que imprevisível, como real possível e decisivo para apontar qual ordem natural nesta miragem neoliberal, uma crença em uma verdade Toda, mercadológica, que não permite qualquer futuro, qualquer falta. Desta forma posto estaria um mundo aético em seus postulados e antiético em seus efeitos com a conseqüência inevitável do desprezo do homem pelo homem.
O ícone da deificação do mercado despreza, pois, o Direito (Constitucional) e propriamente o processo que se torna um mero empecilho, um entrave que impossibilita a tão almejada eficácia imprescindível ao mundo do “just in time”. Assim, menos burocracia para ganhar velocidade, ainda que não se saiba bem o que ela quer dizer quando a questão é manter ou não regras de um instrumento tido, iniludivelmente, como mecanismo de garantia do cidadão.
O eterno conflito “mais velocidade (eficiência), menos garantias (efetividade)” dentro do campo constitucional do processual penal não condiz apenas com o (des)respeito de direitos ditos individuais, todavia, sim, o interesse coletivo é absolutamente preponderante, não no sentido da condenação, mas naquele de se ter uma decisão substancialmente válida. Vez mais, nos dizeres de Coutinho, efetividade reclama a análise dos “fins”, já a eficiência, desde a base neoliberal, responde aos “meios”. Ferrajoli arremata que para o direito penal, há uma submissão da lei fundamental, e o sistema processual será eficiente se realizar a tutela dos direitos fundamentais (…).
Voluntariamente ou não, a celeridade do processo (penal) camuflase na busca de um “tipo ideal” – utilizandome da linguagem weberiana – de “pena sem processo”, mascarandose o processo como instrumento de impunidade. Os holofotes voltamse ao paradigma das ações eficientes, quer dizer, processos curtos e rápidos, tudo a projetar “melhores fins”. O tempo do processo quanto mais curto melhor, ignorandose (?) que a sua dinâmica é e deve ser outra, diferentemente do fluxo social acelerado.
Dirá Ost, nestas hipóteses, a eficácia invocada poderia levar à erosão da ordem constitucional, no esquecimento completo de que o objetivo profundo de muitas regras jurídicas é atrasar a tomada de decisão, ora para permitir que se exprimam todos os pontos de vista e que as paixões arrefeçam, ora para proteger o próprio interessado (diversas regras instaurando prazos de reflexão).
Vendose o direito como estorvo, olvidase que a eficiência pode ser sinônimo de supressão de direitos e garantias, mormente constitucionais, ou, pelo menos, mecanismo de redução dos seus raios de alcance, manipuláveis pela força da hermenêutica. Consolidado está no processo, assim, a corrida ao “quero gozar mais”. Entre a ação delituosa e a concretização da pena, dissese que deve haver a oportunização da dialética do processo, do palco da discussão com paridade de armas para que tenha a viabilidade de decidir de forma eqüidistante. É neste contexto que o risco, o tempo e a velocidade travam o maior confronto com o processo penal.
…